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A Concepção Cristã da Política – Padre Anderson Alves

No dia 2 de outubro ocorrerão as eleições no Brasil. Em períodos como esses, muitos se perguntam: qual é o papel da Política? Como participar nela? Há uma forma cristã de se entender a Política? Em tempos como esses é comum vermos candidatos que lutam por uma visão secular do mundo participarem de atos de cultos cristãos, em busca de votos. E os cristãos se perguntam sobre a sua atuação política. Vamos tentar dar algumas indicações sobre esses temas. Evidentemente, a temática é muito ampla e é impossível tratá-la em poucas páginas. Podemos indicar a leitura do Compêndio de Doutrina Social da Igreja e os livros: Cristãos na sociedade (D. Melé) e Cristianismo e Sociedade, do cardeal J. Hoffner. No Brasil, esses assuntos foram tratados no livro Política, do petropolitano Alceu Amoroso Lima (Tristão de Athayde). Vamos expor algumas ideias desse livro aqui.

O livro de Amoroso Lima parte de uma definição de Política: “é a ciência do governo da sociedade pelo Estado”. A sociedade seria “a união moral de muitos em busca do bem comum”. Essa definição de Política seria adequada por estar de acordo com a teoria das quatro causas, de Aristóteles. Assim, a causa final da Política seria o bem comum; a sua causa formal seria a união dos membros da sociedade; a sua causa material, os próprios membros; a causa eficiente, o homem de forma imediata e o Criador, como o seu fundamento último. A comunidade política tem sua raiz na sociabilidade humana. O homem estabelece vínculos de convivência determinando formas soberanas de organização e de governo. Segundo o Concílio Vaticano II: “a comunidade política existe em vista do bem comum; nele encontra a sua completa justificação e significado e dele deriva o seu direito natural e próprio. Quanto ao bem comum, ele compreende o conjunto das condições de vida social que permitem aos indivíduos, famílias e associações alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição” (Gaudium et Spes, n. 74).

A Política é uma ciência prática. Parte do conhecimento da realidade social, da experiência e do bom senso. A virtude da prudência é essencial para isso. Essa virtude leva a conhecer os princípios morais e os une aos fatos sociais e guia as decisões que devem ser tomadas. A Política é uma ciência moral normativa. É uma ciência prática, que estuda a ordem civil das sociedades e busca levá-las ao seu fim natural: o bem comum. É uma ciência dos atos humanos, que os conhece e ordena.

Há uma concepção cristã de Política que se opõe a dois erros modernos e opostos: o Idealismo político e o Empirismo político. O primeiro considera a Política uma ciência meramente dedutiva. A segunda considera a Política uma ciência puramente experimental.

O Idealismo político considera a Política de forma dedutiva. Acredita que, a partir de determinados princípios metafísicos (da filosofia moderna), se deduzem consequências políticas. A realidade objetiva seria uma matéria a ser moldada, de acordo com os princípios a priori (anteriores à experiência). Isso ocorre no Absolutismo moderno, tanto na concepção de soberania absoluta do Estado (Hegel), como na soberania absoluta do povo (Spinoza). Essa teoria justifica a monarquia absoluta moderna e o regime comunista. O marxismo, como filho do hegelianismo, não considera a Política uma ciência autônoma. Ela seria a aplicação concreta de princípios imutáveis fornecidos pela Economia, ou seja, pela concepção materialista da História. A Política seria uma espécie de apêndice da Economia, algo totalmente deduzido dela. Essa concepção nega a união da Política com a Filosofia moral. A Política buscaria descobrir os princípios gerais da ciência do governo na natureza sensível do homem. E considera o homem uma simples matéria.

O Empirismo político é uma forma de indutivismo. Afirma que a única fonte segura de conhecimento é a experiência e não as ideias puras. A Política seria uma constante adaptação às circunstâncias, um pragmatismo contínuo. Essa é a origem do relativismo político moderno dos regimes liberais e democráticos. Segundo essa forma de entender, a Política não faz parte da ciência filosófica, mas seria uma “ciência natural”. Teria, como as demais ciências experimentais, um “rigor quantitativo”. Para o Pragmatismo não há princípios gerais (filosóficos e morais) da Política. Ela seria uma atividade meramente empírica, de adaptação às circunstâncias do meio, da raça, do momento, da contingência pura.

A concepção integral e cristã da Política repele os erros contrários. A Política não é mera ciência experimental, mas uma ciência que opera sobre o homem e a sociedade no âmbito das realidades contingentes, e não necessárias. Ela precisa da observação empírica, a qual constitui o seu material de trabalho. Ela precisa de fatos, aos quais une princípios gerais (filosóficos e morais) para estabelecer constâncias e leis entre os fatos dispersos. De fato, a Política precisa estabelecer o ideal social, as condições do bem comum, a finalidade social, garantindo o progresso físico, intelectual e moral do homem. E isso vem de uma ciência superior a ela, que estuda os atos humanos na sua universalidade: a Filosofia prática ou Ética geral. A Política seria assim uma ciência moral particular, iluminada pelos princípios da Ética geral. Não é determinista, que parte de postulados imutáveis (da metafísica moderna), nem é um empirismo pragmático.

A Política precisa dos fatos para interpretá-los à luz dos princípios morais superiores. É uma experiência racionalizada. Segundo a concepção cristã, essa experiência é também sobrenaturalizada. Pois o homem não é um ser abstrato. Ele possui um fim que escapa à observação natural e à natureza quantitativa. A sua natureza não pode ser conhecida integralmente pela razão e pelas ciências racionais. Ele precisa ser conhecido a partir da Revelação, que é o princípio da Teologia.

Pela razão sabemos que o homem é um animal racional. A razão humana liga o homem a uma realidade que transcende infinitamente a natureza visível. “O homem transcende infinitamente ao próprio homem” (Pascal). Além disso, o homem é uma criatura com um destino sobrenatural, ao qual ordena a sua existência. A Política integral começa com a análise das realidades contingentes; passa a ser ciência, ao receber os princípios da Filosofia moral. E termina sendo iluminada pela ciência sobrenatural, que se ocupa da ordem sobrenatural: a Teologia. A concepção cristã da Política, portanto, não é “naturalista”. O “naturalismo político” invade o Ocidente desde o Renascimento. Desconhece ou nega a existência de uma ordem sobrenatural que se reflita na vida das sociedades. O cristianismo completa a concepção científica da Política com a luz da Revelação. A Política integral é então empírica, moral e cristã. Observa os fatos, interpreta-os à luz dos princípios morais e subordina tudo à ordem sobrenatural.

A Política deve gerar o bem comum de todos, especialmente dos mais débeis. Quem trabalha para o Estado deve servir ao bem comum, e não aos seus interesses particulares ou de partido. A autoridade pública deve respeitar os direitos fundamentais das pessoas, especialmente o direito à vida e o exercício pleno da sua liberdade. Deve administrar a justiça com o respeito pelos direitos de todos, especialmente das famílias e dos deserdados (CIC, n. 2237). Os cidadãos, especialmente os cristãos, devem “contribuir com os poderes civis, para o bem da sociedade, num espírito de verdade, de justiça, de solidariedade e de liberdade” (CIC, n. 2239). Devem cumprir o seu papel na vida da comunidade política, obedecendo às autoridades na sua função a favor do bem comum.

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