No vasto universo da filosofia, poucos pensadores deixaram uma marca tão indelével quanto Aristóteles. Para ele, o objeto de estudo da filosofia é o ser enquanto ser, uma perspectiva que se desdobra em duas formas primeiras: physis e ethos. Estas, sendo realidades primordiais, não necessitam de demonstração de sua existência, pois tal tentativa seria insensata e até ridícula.
A physis, termo que foi traduzido ao latim como natura, denota a natureza que tende ao bem. De forma paralela, a mesma tendência ao bem está presente no ethos. No entanto, o ethos rompe com a necessidade da physis, abrindo espaço para o diferente na liberdade da práxis humana. Aristóteles distingue que, enquanto a physis ocorre sempre (tou aei), o ethos manifesta-se muitas vezes (tou pollákis).
Através do ethos, há uma elevação sobre a physis, reinstaurando certa necessidade na mesma physis, especialmente ao se fixar na constância do hábito (hexis). A práxis humana, segundo Aristóteles, é articulada por hábitos ou virtudes, guiados não pela necessidade da physis, mas pelo logos, que busca um fim, uma razão. Esse entendimento fundou a ética, ciência do ethos, coroando a tradição socrático-platônica e garantindo seu lugar na tradição cultural e filosófica ocidental.
No núcleo semântico da ética como ciência do ethos, encontramos três conceitos-chave: éthos, êthos e hexis. Segundo Santo Tomás de Aquino, ethos é traduzido para o latim como mos, originando a palavra “moral” em português. Mos, moris, no latim, possui dois significados principais: consuetudinem (costume) e inclinationem quandam naturalem, vel quasi naturalem (certa inclinação natural ou quase natural).
Tomás de Aquino ilustra o conceito de ethos com textos bíblicos marcantes (S. Th., I-II, q. 58, a. 1). No primeiro exemplo, ele cita: “Se não vos fizerdes circuncidar segundo o costume de Moisés, não podeis ser salvos” (At. 15,1). Esse versículo destaca o ethos como um costume transmitido socialmente. Outro exemplo é encontrado no Salmo 67, 7: “Ele faz habitar sob o mesmo teto os que têm costumes iguais”. Esse texto evidencia o ethos como um modo de ser pessoal, remetendo ao sentido antigo de casa, a morada do homem na natureza. Baseando-se nessas distinções, Aristóteles afirmou a existência de virtudes éticas, que em português são conhecidas como “virtudes morais”.
Segundo Tomás de Aquino, as virtudes éticas referem-se à inclinação natural do homem, que se torna uma inclinação quase natural, semelhante ao costume, sendo conveniente à força apetitiva. Por isso, toda virtude moral reside na faculdade apetitiva, consolidando a ética como um saber autônomo, essencial para a tradição filosófica ocidental.