Santíssima Trindade: Mistério de Amor! – Monsenhor José Maria Pereira

Vigário Geral da Diocese

Depois de ter celebrado os mistérios da Salvação, desde o nascimento de Cristo (Natal) até a vinda do Espírito Santo (Pentecostes), a liturgia propõe-nos o mistério central da nossa fé, a fonte de tudo e à qual tudo deve voltar: hoje, a Santíssima Trindade; na próxima quinta – feira, a Igreja celebra Corpus Christi; e finalmente, na sexta – feira sucessiva, a festa do Sagrado Coração de Jesus. Cada uma dessas celebrações litúrgicas evidencia uma perspectiva a partir da qual se abrange todo o Mistério da fé cristã: ou seja, respectivamente, a realidade de Deus Uno e Trino, o Sacramento da Eucaristia e o centro divino-humano da Pessoa de Cristo. Na verdade, são aspectos do Único Mistério da Salvação, que, num certo sentido, resumem todo o itinerário da Revelação de Jesus, da Encarnação à Morte e Ressurreição até à Ascensão e ao Dom do Espírito Santo.

Santo Agostinho afirmou que é difícil encontrar uma pessoa que, falando da Trindade, saiba do que esteja falando (Confissões XIII,II). Trata-se de uma tarefa – como foi revelado em sonho a Santo Agostinho – não menos impossível do que aquela de uma criança que tenta esvaziar o mar, usando uma concha.

Toda a vida da Igreja está impregnada pelo Mistério da Santíssima Trindade. E quando falamos aqui de mistério, não pensemos no incompreensível, mas na realidade mais profunda que atinge o núcleo do nosso ser e do nosso agir.

A revelação da Trindade é, portanto, uma cascata de amor: é o gesto supremo da condescendência divina para com o homem. Os gregos diziam: “ Nenhum Deus pode se misturar com o homem” (Platão). Nosso Deus, em vez disso, misturou-se com o homem; tramou sua vida com a do homem, preparando-o para a comunhão eterna com ele.

Mas, é Cristo quem nos revela a intimidade do mistério trinitário e o convite para que participemos dele. “Ninguém conhece o Pai, senão o Filho e aquele a quem o Filho o quiser revelar” (Mt 11, 27). Ele nos revelou também a existência do Espírito Santo junto com o Pai e enviou-o à Igreja para que a santificasse até o fim dos tempos; e revelou-nos a perfeitíssima Unidade de vida entre as Pessoas divinas (Jo16, 12-15).

Quem encontra Cristo e estabelece com Ele um relacionamento de amizade, acolhe a própria Comunhão trinitária na sua alma, segundo a Promessa de Jesus aos discípulos: “Se alguém me ama, guardará a minha Palavra; meu Pai o amará, e nós viremos e faremos nele a nossa morada”(Jo 14,23).

O Mistério da Santíssima Trindade é o ponto de partida de toda a verdade revelada e a fonte de que procede a vida sobrenatural e para a qual nos encaminhamos: somos filhos do Pai, irmãos e coerdeiros do Filho, santificados continuamente pelo Espírito Santo para nos assemelharmos cada vez mais a Cristo.

Por ser o mistério central da vida da Igreja, a Santíssima Trindade é continuamente invocada em toda a liturgia. Fomos batizados em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo; em seu nome, perdoam-se os pecados; ao começarmos e, ao terminarmos muitas orações, dirigimo-nos ao Pai, por mediação de Jesus Cristo, na unidade do Espírito Santo. Muitas vezes ao longo do dia, nós, os cristãos, repetimos: Glória ao Pai e ao Filho e ao Espírito Santo.

Três Pessoas que são um só Deus, porque o Pai é amor, o Filho é amor, e o Espírito Santo é amor. Deus é tudo, e somente amor, amor puríssimo, infinito e eterno. Não vive numa solidão maravilhosa, mas é sobretudo fonte inesgotável de vida que se doa e se comunica incessantemente.

Meditando sobre a Trindade, dizia S. Josemaria Escrivá: “Deus é o meu Pai! Se meditares nisto, não sairás dessa consoladora consideração. Jesus é meu Amigo íntimo! (outra descoberta), que me ama com toda a divina loucura do seu Coração.

O Espírito Santo é meu Consolador!, que me guia nos passos de todo o meu caminho. Pensa bem, nisso. Tu és de Deus…, e Deus é teu” (Forja, nº2). Desde que o homem é chamado a participar da própria vida divina pela graça recebida no Batismo, está destinado a participar cada vez mais dessa Vida. É um caminho que é preciso percorrer continuamente.

A Santíssima Trindade habita na nossa alma como num templo. E São Paulo faz-nos saber que o amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado (Cf. Rm 5, 5). E aí, na intimidade da alma, temos de nos acostumar a relacionar-nos com Deus Pai, com Deus Filho e com Deus Espírito Santo. Dizia Santa Catarina de Sena: “Vós, Trindade eterna, sois mar profundo, no qual quanto mais penetro, mais descubro, e quanto mais descubro, mais vos procuro.”

Imensa é a alegria por termos a presença da Santíssima Trindade na nossa alma! Essa alegria é destinada a todo cristão, chamado à santidade no meio dos seus afazeres profissionais e que deseja amar a Deus com todo o seu ser; se bem que, como diz Santa Teresa, “há muitas almas que permanecem rodando o castelo (da alma), no lugar onde montam guarda as sentinelas, e nada se lhes dá de penetrar nele. Não sabem o que existe em tão preciosa mansão, nem quem mora dentro dela”. Nessa “preciosa mansão”, na alma que resplandece pela graça, está Deus conosco: o Pai, o Filho e o Espírito Santo.

Desde pequenos, aprendemos de nossos pais a fazer o sinal da cruz e a chamar a Deus: de Pai, Filho e Espírito Santo.

Assim, com toda a naturalidade, estávamos invocando o mistério mais profundo de nossa fé e da vida cristã: Santíssima Trindade que hoje celebramos.

Só Cristo nos revelou claramente essa verdade: Fala constantemente do Pai: Quando Felipe diz: “Mostra-nos o Pai…”, Jesus respondeu: “Felipe… quem me viu, viu o Pai” (Jo 14,8).

Jesus promete o Espírito Santo: “Quando vier o Espírito da Verdade, ele vos conduzirá à plena Verdade”.

Quando se despede, no dia da Ascensão, afirma: “Ide… e batizai em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo.”

A contemplação e o louvor à Santíssima Trindade são a substância da nossa vida sobrenatural, e esse é também o nosso fim: porque no Céu, junto de Nossa Senhora – Filha de Deus Pai, Mãe de Deus Filho, Esposa de Deus Espírito Santo: mais do que Ela, só Deus –, a nossa felicidade e o nosso júbilo serão um louvor eterno ao Pai, pelo Filho, no Espírito Santo. Estes vieram em nós no Batismo. Estabeleceram em nós sua habitação e nos são mais íntimos do que nós mesmos, diz Santo Agostinho. Em seu nome, e no diálogo com eles, desenvolve-se toda a nossa vida de fé, desde o berço até o túmulo. No limiar da existência fomos batizados “em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”. No ocaso dela, partiremos deste mundo ainda “em nome do Pai, do Filho e do Espírito Santo”.

Cremos no Espírito Santo, que nos infunde a graça para fazer-nos participar da vida divina. Deus que ama ao ponto de continuamente inspirar, mover, iluminar e santificar.

O amor de Deus pede uma resposta, e esta tem que ser livre. Se não for livre, não é amor. Ele deseja ser amado, mas é possível ser rechaçado. O amor é exigente, mas não pode ser exigido. Deus ama muito a sério o ser humano, já que leva tão a sério o amor ou o desamor de cada um.

Amor ou desamor, céu ou inferno, glória ou condenação, Deus acolhido ou rechaçado, objeto de uma livre escolha por parte do ser humano. E cada ser humano escolhe livremente. O Espírito Santo inspira e ilumina, porém não obriga. Pela liberdade, podemos conhecer, amar e servir a Nosso Senhor, e, assim, ganhar a vida eterna.

A Oração (Coleta) da Missa da Solenidade da Santíssima Trindade expressa a riqueza do que estamos celebrando: “Deus, nosso Pai, enviando ao mundo a Palavra da verdade e o Espírito santificador, revelastes o vosso admirável mistério. Concedei-nos, na profissão da verdadeira fé, reconhecer a glória da Trindade e adorar a Unidade na sua onipotência.”

Fazendo o sinal da Cruz, declaramos, a cada vez, nossa vontade de pertencer à Trindade.

Entre todas as criaturas, a obra-prima da Santíssima Trindade é a Virgem Maria: no seu coração humilde e repleto de fé, Deus preparou para Si uma morada digna, para completar o Mistério da Salvação. O Amor divino encontrou nela uma correspondência perfeita e foi no seu seio que o Filho Unigênito se fez homem. Dirijamo-nos com confiança filial à Maria para que, com a sua ajuda, possamos progredir no amor e fazer da nossa vida um cântico de louvor ao Pai, por meio do Filho no Espírito Santo.

Obrigado por ter lido este artigo. Se quiser se manter atualizado, inscreva no nosso canal do WhatsApp acessando aqui

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *