Verdadeira Alegria

Mons. José Maria Pereira

Neste terceiro Domingo do Advento, chamado Domingo “Gaudete”, a Liturgia convida-nos à alegria. O Advento é um tempo de compromisso e de conversão, para preparar a vinda do Senhor, mas hoje a Igreja faz-nos antegozar o júbilo do Natal já próximo. O Advento é também tempo de alegria, porque desperta nos corações dos fiéis a expectativa do Salvador, e esperar a vinda de uma pessoa amada é sempre motivo de alegria. Este aspecto jubiloso está presente nas leituras bíblicas deste Domingo:  “Alegrai-vos sempre no Senhor. De novo eu vos digo: alegrai-vos! O Senhor está perto,” diz-nos São Paulo (Fl 4,4ss). Não se trata de uma alegria “subjetiva”, toda íntima e sentimental, que muitas vezes não passa de uma excitação, mas de uma alegria “objetiva” que se fundamenta sobre realidades em si mesmas alegres, algo que já existe e só espera vir a nós. Nem se trata de uma alegria ‘individual” ou privada, mas de uma alegria “comunitária”; é como comunidade cristã que nós somos hoje convidados à alegria: Alegrai-vos!

O Profeta Sofonias recorda ao povo eleito sua missão e procura despertar nele a esperança e a coragem: “Canta de alegria, cidade de Sião; rejubila, povo de Israel! Alegra-te e exulta de todo o coração, cidade de Jerusalém. O Senhor está no meio de ti, nunca mais temerás o mal”( Sf 3, 14-15); literalmente, seria “está no teu ventre”, com uma clara referência à permanência de Deus na Arca da Aliança, colocada sempre no meio do povo de Israel. O Profeta quer dizer-nos que já não há qualquer motivo de desconfiança, de desânimo e de tristeza, independentemente da situação que devemos enfrentar, porque estamos certos da Presença do Senhor, a única que é suficiente para tranquilizar e rejubilar os corações.

O Profeta escreve: “… exulta de alegria por ti” ( Sf 3, 17 ). A alegria que é prometida neste texto profético encontra o seu cumprimento em Jesus, que se encontra no seio de Maria, a “Filha de Sião”, e assim estabelece a sua morada no meio de nós ( Jo 1, 14 ). Com efeito, vindo ao mundo Ele doa-nos a sua alegria, como Ele mesmo confia aos seus discípulos: “ Digo-vos essas coisas para que minha alegria esteja em vós e vossa alegria seja completa” ( Jo 15, 11 ).

A alegria do cristão é feita de uma esperança viva, com base na Ressurreição de Cristo e que tem por objeto uma herança conservada nos céus. Porém, além da esperança, é preciso também outra virtude teologal: a caridade, isto é, mais existencialmente, ser amados e amar.

O Evangelho ( Lc 3, 10 – 18 ) diz-nos que para acolher o Senhor que vem devemos preparar-nos, prestando muita atenção à nossa conduta de vida. Às várias pessoas que lhe perguntam o que devem fazer a fim de estar prontas para a vinda do Messias, João Batista responde que Deus não exige nada de extraordinário, mas que cada um viva em conformidade com critérios de solidariedade e de justiça; sem elas não é possível preparar-se para o encontro com o Senhor. Perguntemos, também nós, ao Senhor o que espera e o que deseja que façamos, e comecemos a compreender que Ele não exige gestos extraordinários, mas que levemos uma vida comum em retidão e bondade. Finalmente, João Batista indica quem devemos seguir com fidelidade e coragem. Antes de tudo, nega que ele mesmo é o Messias, e depois proclama com determinação: “Eu vos batizo com água, mas virá Aquele que é mais forte do que eu. Eu não sou digno de desamarrar a correia de suas sandálias” ( Lc 3, 16 ). Aqui observamos a grande humildade de João, ao reconhecer que a sua missão consiste em preparar o caminho para Jesus. Deus faz-se homem como nós, para nos outorgar uma esperança que é certeza: se O seguirmos, se vivermos com coerência a nossa existência cristã, Ele atrair-nos-á a Si, levar-nos-á à comunhão consigo; e, no nosso coração, haverá a alegria verdadeira e a paz autêntica, inclusive no meio das dificuldades, também nos momentos de fragilidade.

Escreveu Santo Agostinho: “Todo ser tende, como força própria, para o “seu lugar”, isto é, para aquele ponto onde sabe que vai encontrar o próprio descanso, a própria paz”. A alegria consiste em tender para aquele lugar”. E qual é, para nós, criaturas racionais, “o nosso lugar”? É Deus! Qual é o impulso que nos impele para Ele? O Amor! Cada um de nós é impelido pelo próprio desejo de amor. Somente quem é amado e quem ama sabe, realmente, o que é a alegria. Eis porque a Escritura diz que a alegria é fruto do Espírito Santo (Rm 14, 17), e que os primeiros discípulos estavam cheios de alegria no Espírito Santo (At 13, 52). Porque o Espírito Santo é o Amor!

Devemos, portanto, ser afáveis, amáveis e bons; a este aspecto humano da caridade se refere S. Paulo quando escreve que a caridade é paciente, a caridade é bondosa. Não tem inveja. A caridade não é orgulhosa. Não é arrogante. Nem escandalosa. Não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não guarda rancor. Não se alegra com a injustiça, mas se rejubila com a Verdade (1Cor 13, 4-6). São essas delicadezas da caridade que mais vezes faltam nas pessoas boas.

Hoje a Palavra de Deus nos motiva a fazer diversos propósitos. Não se pode ser feliz sozinho; “alegrai-vos” significa também: irradiai alegria. O inimigo da alegria não é o sofrimento; é o egoísmo, o voltar-se sobre si mesmo, a ambição. O homem voltado sobre si mesmo é um porco-espinho que mostra somente espinhos, uma casa fechada.

Poderemos estar alegres se o Senhor estiver verdadeiramente presente na nossa vida, se não o tivermos perdido, se não tivermos os olhos turvados pela tibieza ou pela falta de generosidade. Quando, para encontrar a felicidade, se experimentam outros caminhos fora daquele que leva a Deus, no fim só se acha infelicidade e tristeza. Fora de Deus não há alegria verdadeira. Não pode havê-la. Encontrar Cristo, ou tornar a encontrá-Lo, é fonte de uma alegria profunda e sempre nova.

O cristão deve ser um homem essencialmente alegre! Mas a sua alegria não é uma alegria qualquer, é a alegria de Cristo, que traz a justiça e a paz, e que só Ele pode dar e conservar, porque o mundo não possui o seu segredo.

A alegria do mundo procede de coisas exteriores: nasce precisamente quando o homem consegue escapar de si próprio, quando olha para fora, quando consegue desviar o olhar do seu mundo interior, que produz solidão porque é olhar para o vazio. O cristão leva a alegria dentro de si, porque encontra a Deus na sua alma em Graça. Esta é a fonte da sua alegria! Não nos é difícil imaginar a Virgem Maria, nestes dias do Advento, radiante de alegria com o Filho de Deus no seu seio. A alegria do mundo é pobre e passageira. A alegria do cristão é profunda e capaz de subsistir no meio das dificuldades. É compatível com a dor, com a doença, com o fracasso e as contradições. “Eu vos darei uma alegria que ninguém vos poderá tirar” (Jo 16,22), prometeu o Senhor. Nada nem ninguém nos arrebatará essa paz gozosa, se não nos separarmos da sua fonte.

A nossa alegria deve ter um fundamento sólido. Não se pode apoiar exclusivamente em coisas passageiras: notícias agradáveis, saúde, tranquilidade, situação econômica desafogada, etc., coisas que em si são boas se não estiverem desligadas de Deus, mas que por si mesmas são insuficientes para nos proporcionarem a verdadeira alegria.

O Senhor pede que estejamos sempre alegres! Só Ele é capaz de sustentar tudo na nossa vida. Não há tristeza que Ele não possa curar: “Não temas, mas apenas crê” (Lc 8,50), diz-nos o Senhor.

Fujamos da tristeza! Uma alma triste está à mercê de muitas tentações. Quantos pecados se têm cometido à sombra da tristeza! Por outro lado, quando a alma está alegre, abre-se e é estímulo para os outros; quando está triste obscurece o ambiente e faz mal aos que tem à sua volta.

A tristeza nasce do egoísmo, de pensarmos em nós mesmos, esquecendo os outros. Quem anda excessivamente preocupado consigo próprio, dificilmente encontrará a alegria da abertura para Deus e para os outros. Em contrapartida, com o cumprimento alegre dos nossos deveres, podemos fazer muito bem à nossa volta, pois essa alegria leva a Deus.

“Dentro de pouco, de muito pouco, Aquele que vem chegará e não tardará” (Hb 10,37), e com Ele chegarão a paz e a alegria; em Jesus encontraremos o sentido da nossa vida.

Que a nossa alegria seja um testemunho muito forte de que Cristo já está no meio de nós.

Eis, irmãos, em que consiste a verdadeira alegria: é o sentir que a nossa existência pessoal e comunitária é visitada e elevada por um grande Mistério: o Mistério do Amor de Deus. Para rejubilar precisamos não só de coisas, mas de amor e de verdade: precisamos de um Deus próximo, que conforta o nosso coração, e responde às nossas profundas expectativas. Este Deus manifestou-se em Jesus, nascido da Virgem Maria. Por isso aquele Menino, que colocamos na gruta, é o centro de tudo, é o coração do mundo. Rezemos para que cada homem, como a Virgem Maria, possa acolher como centro da própria vida o Deus que se fez Menino, fonte da verdadeira alegria.

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