Os Quatro Tipos de Leitura – Pe. Anderson Alves

Logo depois de nos oferecer conselhos sobre a leitura (ler pouco, escolher os livros e escolher nos livros), Sertillanges apresenta-nos quatro tipos de leitura, aos quais são aplicados os conselhos anteriores. Em geral, lemos por esses motivos: para nos formar e nos tornar alguém; para realizar uma tarefa específica; para nos exercitar no trabalho e no bem e por distração. Essas finalidades dão origem a quatro tipos de leitura: as leituras de base, as leituras de ocasião, as leituras de edificação e as leituras de descanso. Cada gênero deve ser aproveitado e tem exigências particulares. As leituras de base pedem docilidade; as de ocasião, domínio; as de edificação requerem rigor; as de descanso, liberdade.

As leituras de base exigem a nossa confiança, por se tratar de uma formação inicial. Deve-se pedir conselhos para se ler os autores mais autorizados e a leitura deve ser feita com mais confiança do que com críticas. Julgar os autores e as obras apressadamente prejudica o aprendizado. “É preciso acreditar em seu mestre”, dizia Santo Tomás, retomando uma afirmação de Aristóteles. Trata-se aqui não de uma confiança cega, mas de uma atitude de respeito, de reverência, de fé provisória, enquanto não se é dotado dos critérios necessários para se elaborar uma boa apreciação do assunto.

Para essas leituras de base é indispensável escolher o seu guia, a quem se pretende confiar. Essa escolha é séria e difícil. Sertillanges aconselha: para as doutrinas elevadas (filosóficas e teológicas) a guia de Santo Tomás (aliás, o Concilio Vaticano II dá o mesmo conselho). Como não podemos nos limitar a ele, seria bom escolher mais três ou quatro autores que nos dariam uma cultura ou formação geral; eu acrescentaria Santo Agostinho aqui, o grande doutor do Ocidente. Depois, é necessário escolher três ou quatro autores para o assunto da própria especialidade e outros três ou quatro que tratem os problemas precisos que nos interessam. Isso é todo o necessário para se ter uma formação. Outras leituras irão nos oferecer informação, que não é o mesmo da formação, que constitui um patrimônio cultural geral, um critério e uma orientação para a própria vida.

As leituras de ocasião – que servem à realização de um trabalho – exigem um espírito dominado pelo que se pretende fazer. As leituras de exercício ou edificação requerem ou a experiência: o que antes serviu, deve continuar servindo. Uma influência de um autor ou obra pode desgastar com o tempo ou se reforçar. De modo que ter às mãos em momentos de depressão os autores preferidos, as páginas mais estimulantes é um recurso imenso. Há textos e autores que podem se transformar em verdadeiros remédios para as doenças da alma e não é preciso ter medo de retornar a eles quantas vezes for necessário.

Pode parecer mais fácil escolher as leituras de descanso, mas não é assim. Nem toda distração de fato serena ou edifica. Certas leituras não nos relaxam; outras o fazem em demasiado, esvaziando ou tornando superficial a nossa vida intelectual. Outras podem nos desviar, levando-nos para longe do caminho. Os livros desse tipo de leitura devem servir ao nosso descanso. Entretanto, Sertillanges adverte: “Não vos sacrifiqueis ao vosso descanso”. Segundo Tomás de Aquino, uma coisa realmente descansa: a alegria. Tentar se distrair no incômodo é um erro.

No simpático livro “Farmácia literária”, de E. Berthoud e S. Elderkin encontramos o seguinte texto: “Você está adorando o livro, fez amizade com os personagens do livro, devorou o livro, sonhou com o livro, sentiu saudade do livro, chorou com o livro, fez amor com o livro, atirou o livro para o outro lado do quarto, morreu para o mundo fora do livro – e agora está prestes a terminar o livro. Todos nós já passamos por isso; é um momento terrível, visceral. Mas não se desespere: você não precisa deixar o mundo do livro para trás. Assim que o terminar, leia sobre o livro: resenhas, críticas literárias, blogs, o que puder encontrar. Converse com outras pessoas que o leram. Assista ao filme do livro. Leia-o em outra língua ou em uma tradução diferente. E então, por fim, releia-o. Os melhores livros, dos maiores autores, passam bem pelo teste de ser relidos muitas vezes. E, de fato, nos dão mais de volta a cada vez. Desse modo, você nunca terminará o livro. Você se tornará o livro, e ele se tornará parte de você. Você não chegou ao fim. Na verdade, está só começando” (p. 335).

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