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Conselhos Para uma Boa Leitura (Parte III) – Pe. Anderson Alves

Vimos que Sertillanges dá dois conselhos para uma boa leitura: ler pouco e escolher. Já falamos do primeiro conselho, agora vamos tratar do segundo. O princípio da escolha diz que devemos discernir o que serve de alimento ao nosso espírito, tornando-se origem dos nossos pensamentos. Ele cita: “Pois o que lemos hoje com indiferença despertará oportunamente e nos fornecerá, sem que percebamos, pensamentos que serão fonte de nossa salvação ou de nossa perdição. Deus desperta bons pensamentos para salvar; o diabo desperta maus pensamentos cuja semente encontra em nós” (Nicole, Ensaios de moral contidos em tratados diversos, Paris, 1733, p. 244).

Isso nos recorda a palavra do joio e do trigo. O semeador semeia o trigo durante o dia; o semeador é Jesus Cristo e o trigo é a palavra de Deus. O inimigo semeia o joio durante a madrugada. Jesus diz que esse inimigo é o diabo e ambos – joio e trigo – crescem juntos no mesmo campo até a época da colheita, que ocorrerá no fim dos tempos. Se o joio é a palavra de Deus, o trigo também deve ser uma palavra: a palavra do diabo, que gera confusão, dúvida, irritação, descrença e separação de Deus e do próximo. Essa palavra pode ser ouvida ou lida, gerando depois frutos na nossa alma e nas nossas escolhas.

Sertillanges diz que é preciso escolher os livros e escolher nos livros. Escolher os livros significa não confiar na propaganda interessada, nos títulos ou nas capas atraentes. É preciso buscar conselheiros sábios, abnegados e experientes no assunto. É necessário beber nas fontes do pensamento, nas obras originais e nos clássicos. Deve-se ler obras de primeira mão, onde brilham as ideias mestras e inovadoras. A maior parte dos escritores não são autores, mas apenas editores: copiam, colam, repetem, reduzem as ideias e acabam entrando em contradição, que é mais uma forma de se repetir. O mundo está cheio de livros, mas as obras de pensamento são raras. É preciso ler o que realmente se escreve de bom, de inovador e atual. Porém, não se pode cair na superstição do novo. É preciso antes amar os livros que dizem as verdades eternas, ainda que elas sejam poucas e humildes.

É preciso ainda escolher nos livros, pois nem tudo tem o mesmo valor. Isso não significa ser juiz dos autores, mas considerar-se um irmão e um amigo deles. Em certos aspectos, eles são nossos guias. “O livro é um irmão mais velho: é preciso honrá-lo, abordá-lo sem orgulho, escutá-lo sem prevenções; suportar seus defeitos, procurar o trigo na palha” (Sertillanges, A vida intelectual, CDB, 2022, p. 169-170). Porém, é preciso também saber deixar de ler um livro, quando ele faz mal aos nossos pensamentos e à nossa alma. “Os livros são obras humana e a corrupção do homem mescla-se na maioria das suas ações, e como ela consiste na ignorância e na concupiscência, quase todos os livros se ressentem desses dois defeitos” (Nicole, op. cit., p. 246).

Por fim, diz Sertillanges que um livro vale o que valemos e o que fazemos com que ele valha. Leibniz e Santo Tomás, por exemplo, liam de tudo. Esse último lia obras dos hereges cristãos, dos filósofos e escritores gregos, romanos, judeus e muçulmanos e seu pensamento não foi prejudicado, antes, foi enriquecido por tudo isso. Tomás deixou-nos a importante afirmação, que procedia de um autor antigo, chamado Ambrosiaster: “Omne verum, a quocumque dicatur, a Spiritu Sancto est”, ou seja, “toda verdade, dita por quem quer que seja, procede do Espírito Santo”. Sertillanges diz que um homem inteligente encontra inteligência em todo lugar. E um “néscio projeta sobre todos os muros a sombra de sua fronte estreita e inerte” (p. 170). De forma que é preciso escolher o melhor que podemos e buscar o que realmente seja bom, verdadeiro, belo, justo e prudente. Assim desenvolveremos em nós essas mesmas qualidades e a semente produzirá bons frutos.

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