Segundo Manfred Spitzer, em “A epidemia do smartphone”, os efeitos negativos dos smartphones sobre os olhos, especialmente a miopia contraída, ocorrem até a idade de vinte e cinco anos, quando os olhos param de se desenvolver. Hoje, milhões de pessoas passam entre um quarto e um terço do seu tempo em estado de vigília diante das tecnologias digitais de informação, especialmente o smartphone, que é a principal causa da miopia. Apenas 3% dessa enfermidade é hereditária. Em 97% dos casos, é chamada de “adquirida” e se desenvolve, principalmente, nas primeiras duas décadas de vida.
Entretanto, parece que não podemos demonizar ou abolir totalmente as tecnologias de informação da vida atual. Devemos, contudo, estar atentos aos seus efeitos nocivos com a intenção de reduzir os danos. Ao longo da história, diversas tecnologias foram descobertas e houve um período de entusiasmo em relação a elas, mesmo tendo gerado graves problemas de saúde, que seriam conhecidos apenas posteriormente.
Quando o raio X foi descoberto, em 1895, por exemplo, tornou-se moda fazer radiografias dos ossos em festas particulares e havia nas sapatarias da Europa máquinas usadas para fazer fotos dos ossos dos clientes, especialmente das crianças, pois acreditava-se que era indispensável ter sapatos perfeitamente adaptados aos pés. Os efeitos negativos dos raios X foram logo descobertos, mas apenas em 1972 aqueles aparelhos foram totalmente banidos das sapatarias da Alemanha. Os que diziam ser indispensável o uso daquela tecnologia nas sapatarias, sem qualquer tipo de proteção ou preparo especial por parte dos que a manejavam, eram os seus fabricantes, movidos por interesses meramente comerciais. Não foi a medicina da época que afirmou ser imperativo ter aqueles aparelhos nas sapatarias.
Ao longo da história, foram adotadas medidas legislativas para regular o uso de diversas conquistas tecnológicas e diminuir os seus danos. Isso ocorreu com a eletricidade, com os aviões, com os fertilizantes, com os veículos, com o álcool etc. Isso é um processo normal, que tem a intenção de proteger principalmente crianças e jovens. Pensemos no exemplo do cigarro, que por muitos anos foi fortemente promovido pela indústria do entretenimento até ser, finalmente, banido das escolas. Hoje, a Coreia do Sul tem a taxa mais elevada de smartphones no mundo. Naquele país, 100% dos jovens possuem ao menos um aparelho. Há anos o governo sul-coreano adotou medidas para tutelar os jovens e evitar os efeitos mais graves do smartphone.
Não podemos demonizar a tecnologia, mas regular o seu uso. Algo diverso da miopia é a presbiopia, que consiste na perda progressiva da capacidade do olho de focar objetos próximos devido ao envelhecimento. As pessoas afetadas pela presbiopia são incapazes de ler livros e dizem que “têm os braços muito curtos para ler”. Para eles, o ebook é de grande ajuda, pois permite aumentar o tamanho das fontes. De forma que a relação entre smartphone e miopia diz respeito sobretudo aos jovens, com idade inferior a 25 anos. Até essa idade, os celulares prejudicam os olhos e causam miopia. E a responsabilidade por isso é, certamente, dos adultos. Um adulto não pode dizer a uma criança com miopia “é sua culpa, se você tem miopia por usar o celular” do mesmo modo que não poderia dizer: “é sua culpa se bebe tanto álcool em casa”.
A miopia não é algo simples. Ao longo do tempo, implica uma elevada possibilidade de desenvolver outros distúrbios na vista, como a catarata e o consequente comprometimento da capacidade de visão, a elevação da pressão ocular (glaucoma) – com possibilidade de cegueira –, a degeneração ou o deslocamento da retina, que pode causar doenças graves e a cegueira. Não se pode dizer aos jovens “deves olhar o celular do modo correto”, pois de qualquer modo se olha para a sua tela de uma distância muito curta. Portanto, nesse caso, não é correto dizer que é a dose que transforma o remédio em veneno. Em qualquer dose, o smartphone é um veneno. Para aqueles com mais de 25 anos, o tempo de uso do aparelho é relevante. Menos tempo diminui os seus efeitos colaterais. Com os jovens, isso não ocorre: sempre produz um dano significativo, e isso é responsabilidade dos adultos.